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sexta-feira, 10 de setembro de 2010

( SUGESTÃO DE LEITURA E REFLEXÃO NO FINAL DE SEMANA )

(Texto extraído da NET )

PONTO DE ENCONTRO DA FILOSOFIA

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Sobre o que é e o que deve ser

No segundo livro da Torah hebraica (o Antigo Testamento dos cristãos), intitulado Êxodo, além da história do povo hebreu, há diversas leis. Um delas (cap. 21, ver. 28.) diz o seguinte: “Se algum boi chifrar homem ou mulher, que morra, o boi será apedrejado, e não lhe comerão a carne; mas o dono do boi será absolvido”. Ao ler uma sentença como essa, muitas pessoas provavelmente acharão estranho, e talvez julguem haver uma explicação adequada para o que parece, à primeira vista, algo despropositado. Aparentemente, o boi está sendo punido, e não seu dono. Aplicando aos dias atuais, em grandes cidades, seria como punir apenas cães ferozes (rottweilers, por exemplo) sem responsabilizar seus donos. Independente do sentido original da regra no mundo judeu, o ponto surpreendente se liga a um de nossos pressupostos mais importantes: seres humanos, diferente de coisas e de animais, têm obrigações morais. É geralmente aceito que não se deve mentir, a não ser que haja uma razão muito específica para fazê-­lo (alguns dirão ainda que em hipótese alguma); também se considera que temos a obrigação de, em algumas situações, ajudar outras pessoas. Essas são crenças morais. As pessoas, em geral e especialmente na sociedade em que vivem, mantêm conjuntos de crenças morais muito similares, e elas não têm, na vida cotidiana, dificuldade de identificar uma crença moral. Crenças morais se referem a regras morais (embora não lhes sejam idênticas), e geralmente é fácil distingui­las de outras regras. Dificilmente alguém julgaria que a regra, de um jogo de xadrez, “não se deve mover o peão lateralmente”, seja uma regra moral. Na mesma linha, crenças morais se referem a valores morais, e se distinguem de outros valores. Temos, então, estéticos, morais, religiosos, políticos, cognitivos, sociais. Outros tipos de regras, como regras técnicas, regras de jogo, não são adequadamente classificadas como valores. Mesmo diferenciando esses tipos, em casos concretos pode haver alguma dificuldade, ou um mesmo valor ser sub­ sumido em diferentes categorias. Por exemplo, o valor da humildade é tanto religioso quanto moral. Já uma regra como “devemos pagar nossos impostos” se refere a um valor político, mas não é claro se também a um valor moral. As considerações que se seguem têm aplicabilidade às diversas categorias, embora em grau maior ou menor. Em razão de sua conexão mais óbvia com o assunto, iremos usar como rio condutor a idéia de valores morais.

Uma resposta influente diz que a característica fundamental de um valor é ser acerca de como os fatos deveriam ser, e não como eles efetivamente são. Dizer que nós devemos respeitar o que pertence a outro não equivale a dizer que, de fato, as pessoas respeitam a propriedade alheia. É antes afirmar que temos uma obrigação, um dever, de fazê-­lo, e caso não o façamos, agimos mal. Uma crença moral não descreve as ações das pessoas, mas as prescreve. Isso transparece ao considerarmos raciocínios morais ou práticos.2 Em um raciocínio moral, a conclusão nunca pode ser derivada exclusivamente de premissas factuais. Por exemplo, se um político em um cargo executivo está considerando a possibilidade de aceitar suborno para liberar uma obra. E digamos que as premissas que ele entretém são: aceitar suborno é proibido pela lei e passível de punição; se os jornais descobrirem, tornarão minha vida insuportável; meus pais me ensinaram a não aceitar dinheiro ilícito. Digamos ainda que a conclusão de seu raciocínio prático seja: devo recusar o suborno. Ora, não há qualquer processo inferencial, seja indutivo ou dedutivo, que permita tirar essa conclusão a partir daquelas premissas. Há, então, alguma premissa oculta, cuja presença autoriza a conclusão. Coloquemos o argumento em forma:

Premissa 1: aceitar suborno é proibido pela lei e passível de punição.

Premissa 2: se os jornais descobrirem, tornarão minha vida insuportável.

Premissa 3: meus pais me ensinaram a não aceitar dinheiro ilícito.

Premissa 4 (oculta): é preciso evitar ações que a maioria das pessoas julga serem erradas.

Conclusão: devo recusar o suborno.

Se considerarmos cada uma das três primeiras premissas (todas elas se referem a questões de fato, e podem ser verdadeiras ou falsas) individualmente ou em conjunto, veremos que nenhuma delas constitui uma razão que justifique a conclusão. Tomemos a primeira. A proibição legal de suborno poderia ser vista de uma outra perspectiva; por exemplo, se o sujeito julga que transgredir normas legais é estimulante, e que deve viver sua vida da forma mais estimulante possível, aceitará o suborno, tomando as medidas para não ser pego, provavelmente. Somente a quarta premissa (que se refere a uma questão de valor, e não pode ser verdadeira ou falsa), em conjunto com as demais, conduz à conclusão. Essa quarta premissa é uma regra moral, e determina como alguém deve agir; as outras especificam o contexto em que ela se aplica. Assim com qualquer raciocínio prático, isto é, com qualquer raciocínio que tenha como objeto aquilo que deve ser, e não apenas aquilo que é.

A tese de que a conclusão de um raciocínio moral nunca é derivada exclusivamente de premissas factuais é, na verdade, a aplicação de uma tese mais geral. Como crenças morais se referem a valores morais, e estes são apenas um tipo de valores, vale o mesmo princípio sempre que estiver presente algum valor, a saber, que há uma separação radical entre questões de fato, por um lado, e questões de valor, por outro. Não apenas no sentido de que são diferentes, mas principalmente no sentido de que não é possível passar de um ao outro; conseqüentemente, há entre juízos de fato e juízos de valor uma distinção lógica, não existindo uma “ponte” que liga o fato ao valor, ou vice-­versa. Da regra “Não matarás”, não se segue nenhuma previsão possível acerca do comportamento das pessoas. E, ao examinar o comportamento de um grupo social, é possível chegar a uma conclusão do tipo “as pessoas tendem a se auxiliar mutuamente em momentos de dificuldade”, mas isso não equivale nem conduz à regra “as pessoas devem se auxiliar mutuamente em momentos de dificuldade”. Em uma explicação social adequada, pode-­se argumentar, é preciso descobrir quais são e fazer referência às regras que as pessoas observam em suas relações sociais; só assim compreendemos o que elas estão fazendo. Regras morais, portanto, se referem a questões de fato, especialmente quando se trata de sua aplicação. Contudo, não derivam delas. Por exemplo, uma regra moral aceita na Antigüidade era “os desiguais devem ser tratados de forma desigual”. Para aplicar tal regra em situações concretas, era preciso saber quem era igual a quem, e igual em que aspecto; essa é uma investigação factual. Em casos assim, a regra pode permanecer a mesma, mas afetar diferentemente as ações, na medida em que muda a compreensão acerca do fato. Por exemplo, o tratamento desigual às mulheres se devia, pelo menos em parte, por se acreditar que elas são diferentes dos homens em aspectos relevantes. Na medida em que a Ciência foi desmistificando tais opiniões, mudou o tratamento.

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